Geni acordou, não de um sono, mas do estado anestésico que entra depois de uma noite de trabalho, e decidiu ceder ao impulso de carência que lhe tomou a mente. Tentou ir ao cinema, à praça central, à rua XV, à lojas de departamentos, à academia e até em velórios, mas não encontrou ninguém. Resolveu procurar uma agência de namoros, preencheu todos os dados, e no lugar da profissão disse que era empresária, o que não deixava de ser verdade. Um dia, enquanto ainda estava no estado letárgico, o telefone tocou. - alô? - boa tarde sra. Geni (nunca ninguém usou esse pronome com ela), aqui é da agência de namoro, temos um interessado compatível com o seu perfil. Podemos marcar um encontro? Geni, meio trêmula, respondeu - Claro, mas tem que ser na terça, fim de semana eu trabalho muito e só tenho segunda pra descansar. Ok, estava tudo agendado. Ela passou a semana imaginando que aquele encontro poderia mudar a sua vida e que, quem sabe, poderia até se livrar daqueles caras imundos pra quem vendia não só seu corpo, mas também um pouco daquilo que chamam de alma. Pobre Geni, apesar da vida que leva, não coconsegue abandonar a ingenuidade. Era terça, dia do encontro. Geni se arrumou da maneira que podia e foi. Ao chegar na agência quis morrer, o seu pretendente era um dos clientes mais escrotos que já tinha atendido. Voltou pra casa mais puta do que já é. No fim, aprendeu a lição e acabou entrando novamente em um grupo de sexo casual do bate papo da uol.
Maldita Geni
Pseudocrônicas de quem dá pra qualquer um
quarta-feira, 11 de março de 2015
sexta-feira, 20 de dezembro de 2013
15 - Daquilo que não se pode limpar
Depois de uma longa noite de trabalho era de se esperar que Geni se arrastasse para a cama. Mas não, aquilo que deveria lhe proporcionar conforto só lhe lembra imundes. Uma hora inteira embaixo do chuveiro tentando limpar aquilo de que seu corpo e espírito já se apropriaram. Os fluidos indesejáveis e o cheiro do perfume barato vão embora, mas a energia desperdiçada e mal paga não se repõe. Só nascendo de novo, Geni.
terça-feira, 8 de outubro de 2013
365 dias
Desde que começara nesta vida Geni sempre comemora seu aniversário do mesmo jeito. Nesse dia ela não trabalha, mas bebe, cheira, se denigre ao máximo que puder, para poder esquecer por algumas horas a decadência que vive por ser o que escolheu ser. Ela não cabe mais em si, porque já carrega outros corpos, outros cheiros, outros fluidos que não o dela. Acabara por se tornar mais seus clientes do que ela mesma. Mas o dia já amanheceu e é hora de colocar a máscara e sorrir.
sábado, 31 de agosto de 2013
13 - Geni e o zepelim
Seu corpo pedia socorro, mas ela só pensava na conta de aluguel. Um cliente atrás do outro e a saúde cada vez mais debilitada. Geni ouvia Chico Buarque e sonhava com o comandante de um zepelim. Mas isso nunca aconteceu. Depois percebia que nunca poderia ser de um só, que preferia ser apedrejada, humilhada, suja com o resto dos que se dizem humanos, do que pertencer a alguém. A verdade é que Geni era do mundo mas não cabia em lugar algum.
quarta-feira, 7 de agosto de 2013
12 - Das ilusões
Ele vinha religiosamente todas as terças a noite. Como era cliente fixo, Geni o recebia em sua própria casa. Seria seu cliente preferido se não tivesse o péssimo hábito de dormir logo após o primeiro orgasmo. Geni, sempre tentando ver o lado bom da vida, deixava que ele passasse a noite ali mesmo, dormindo ao lado dela. Em troca fantasiava ser sua esposa e colocava os braços dele sobre seu corpo. Foi o mais próximo que Geni chegou ao que chamamos de casamento.
terça-feira, 16 de julho de 2013
11 - Do que ganha
Geni não é puta rampeira. Mas
também não é puta de luxo. Devido ao corpo invejável conseguiu um bom cafetão
logo no começo. Fez alguns trabalhos como ficha rosa também, mas a boa quantia
de dinheiro que o serviço lhe rendeu ela gastou em pó. Com o tempo o corpo e
principalmente a expressão facial mudaram – e o cachê também. Mas Geni ainda
tem (bons) clientes fixos, o que lhe dá a segurança de sempre ter dinheiro pra
pagar os produtos que compra por catálogo de sua vizinha.
quarta-feira, 10 de julho de 2013
10 - Das promessas esquecidas
Uma ou duas carreiras e lá está
ela, pronta pro trabalho. A saia mais colada combina com o salto mais alto.
Mesmo depois de cinco anos de profissão, seu corpo ainda chama atenção – o que
significa dinheiro. No começo prometeu a si mesma que só faria o serviço se
fosse com a cara do cliente. Um tempo e algumas contas depois a promessa ficou
esquecida.
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